As cores que os meninos distinguem pela cidade são repetitivas. Uma aquarela Limitada em tons desmaiados de fraqueza. Matizes anêmicas, sangue ralo. Ouso o desejo de colorir a cidade para os meninos. Ouso projetar tingir os muros. As tábuas. Os colchões espalhados sob o experiente viaduto. Os cobertores leves-ásperos, confeccionados com material barato. Ouso planejar distribuir cantis de água benzida para purificar os corpos. Cantis em cores divertidas que se tornariam, no futuro, doces lembranças para os meninos daqui. Daqui. Dessa cidade. A cidade por onde caminho agarrada aos meus pavores. Aos meus desesperos. Por onde aguardo que o semáforo se avermelhe, enquanto seguro firme a mão dos meus rancores antes de atravessar para o outro lado. Dos meus temores, que nunca amadureceram.
trecho de "Para colorir a cidade"
Lilia Guerra é autora da coleção de contos Perifobia e dos romances Rua do Larguinho e Amor Avenida, originalmente publicado em 2014 e relançado em 2022 pela editora Patuá. Também publicou três volumes do livro Novelas que escrevi para o rádio.